Ameaça ou argumento?

A bola é minha. Se eu não jogo, ninguém joga

Esta imagem/situação, à diferença da anterior (que era não verbal e de autoridade simultaneamente), não entra em duas categorias diferentes, mas pode ser um tipo ou outro dependendo de como interpretemos o que foi dito. Por um lado pode ser ameaça, por outro pode ser argumento dependendo de como a entendemos. Me explico:

Se parece a uma ameaça se construimos a frase da seguinte maneira:

“Ou vocês me deixam jogar ou vocês também não jogarão”

Se parece a um argumento se construimos desta outra forma:

“(Premissa 1) Quem proporciona a oportunidade de diversão aos demais tem direito a participar na atividade. (Premissa 2) Porque eu sou o dono da bola (e por conseguinte, me adequo à premissa anterior), devo jogar também. (Conclusão)”

Independente de se concordamos com a premissa 1. Se pensamos da segunda maneira, a criança que fala está argumentando. Os demais podem ou não ser persuadidos.

Se escolhemos interpretar a fala da criança como argumento, o que vai definir se seremos persuadidos pela argumentação é o valor de verdade que damos à primeira premissa.

Por que discordaríamos da premissa 1? Se pensamos na questão de desigualdade social, certamente se os outros também tivessem bola, isso deixaria de ser uma questão hierárquica e de poder em relação às regras da brincadeira. E não parece justo que por questões materiais alguém seja favorecido.

Por que concordaríamos com a premissa 1? Porque se pensamos em outra situação, que não fosse material, mas que alguém deu uma boa ideia, alguém tem uma habilidade diferenciada que possibilita um tipo de interação específico que outros não possam proporcionar. Se torna uma questão de lealdade e de gratidão em relação a quem teve algo a mais a oferecer. Ao mesmo tempo pode servir de estímulo para que outros sugiram também e agreguem à experiência de todos, em vez de estimular o individualismo.

Não sei se vocês pensaram nisso, mas poderíamos dizer que para sermos persuadidos precisamos decidir se a premissa 1 se aplica ou não a este caso. Numa situação real outros elementos seriam ainda relevantes, como a quantidade de crianças, se é possível que todos participem, se a exclusão do dono da bola é uma questão “implicância” entre os envolvidos ou uma necessidade, a duração da brincadeira, entre outros.

Se ao final não concordamos com a premissa, ainda assim o dono da bola continua tendo o poder sobre as outras crianças. Porque mesmo que os demais discordem, ele ainda pode persuadir aos demais impedindo que joguem. Neste caso, poderíamos classificar a persuasão segundo o marketing como uma persuasão por escassez. Se vocês se lembram do caso do brinquedo de natal também se adequaria nesse tipo de persuasão: convencidos pela falta de opção melhor.


Katarina Krys Müller
Texto e imagens de Katarina Müller

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